19.12.07

Fashion Victims

por Ines Andrade




"Deixem desmoronar, será a culpa de Israel e dos Americanos", palavras de Yasser Arafat no ano da sua morte. Mal o líder da OLP sabia que, em 2007, num pequenino país à beira mar plantado, milhares de estudantes iam andar pelas noitadas do Porto envergando o “belo do lenço”. Esta epidemia está a abranger os jovens da nossa sociedade, nascidos, curiosamente, entre a primeira e segunda Intifada.
O tradicional lenço quadriculado, o kaffiyeh, representa décadas de luta pelo território palestiniano, mas para a geração “morangos com açucar”, o lenço não evoca violência nem nacionalismo, não passa dum artefacto que combina com as all-stars rosa e os cintos Dolce&Gabbana. Depois de ateus a usarem santos ao pescoço, clientes assíduos do macdonald’s com imagens do Che, um anúncio da Nike com a “revolution” dos Beatles, só falta contrastar o lenço com a estrela de David. Cria-se um intenso paradoxo entre um símbolismo ideológico e um comportamento consumista próprio do sistema capitalista.
Em voga está o “bandit look”. “Bandit look”? Vende-se um estilo rebelde e revolucionário para preencher o vazio duma sociedade que demitiu os heróis; uma sociedade em declínio, sem aspirações ou soluções, que se apropria dos ideais alheios desapropriando-os dos seus propósitos? Geração enganada voluntariamente, presa num argumento de vídeo-clip sem conteúdo, onde a próxima conquista passa por conseguir uma “espécie de lenço TALIBAN” (preto, vermelho, azul ou verde), a combinar com o cardigan cinzento. Um lenço “versátil” para todas as ocasiões, com o “padrão” adequado para as bebedeiras (atipicamente muçulmanas) e o estilo “étnico” exigido nesta colecção. Os miúdos estão-se realmente a “borrifar” para lutas ideológicas desde que consigam “guest” para a discoteca; e vê-los em manifestações só se houver cerveja à borla. Nesta geração “copy/paste” o que todos usam tem de se adquirir, e assim lá andam eles, com o lenço ao pescoço, o lenço cuja função na Palestina é proteger a cabeça do sol, e os olhos do pó. Pó e areia que a população juvenil ocidental lhes atira.
“Yasser Arafat sabia que os ícones se fazem de outros ícones, de imagens permanentes que entram no imaginário como símbolos inapagáveis”, o que ele não sabia é que, da mesma maneira que o Che Guevara acabou estampado em t-shirts de 1.50€, o kaffiyeh seria o último grito das “fashion victims”; vítimas sim, duma sociedade egoísta e nada preocupada com os telhados de vidro dos vizinhos, ou com as “pedras” que uns e outros atiram.






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