21.1.10
abreviatura de algo gigante
21.7.09
16.7.09
"Dispidida"
26.6.09
Ponto de Referência de Quem Sou
Quem morreu? O próprio Alves? DouAo diabo o bem-’star que trazia.
Desde ontem a cidade mudou.
Quem era? Ora, era quem eu via.
Todos os dias o via. Estou Agora sem essa monotonia.
Desde ontem a cidade mudou.
Ele era o dono da tabacaria.
Um ponto de referência de quem sou.
Eu passava ali de noite e de dia.
Desde ontem a cidade mudou.
Meu coração tem pouca alegria, E isto diz que é morte aquilo onde estou.
Horror fechado da tabacaria!Desde ontem a cidade mudou.
Mas ao menos a ele alguém o via,Ele era fixo, eu, o que vou,
Se morrer, não falto, e ninguém diria:
Desde ontem a cidade mudou.
Álvaro de Campos
18.4.09
Untitled
16.4.09
12.4.09
Adornos
William Shakespeare
6.4.09
25.3.09
16.3.09
Apetece me fazer um breve ensaio sobre os ovos kinder. Ovo surpresa, hmm que sabia bem porque era a porta para a descoberta. Mas a surpresa nunca era a que dava na televisão ou a que aparecia na caixa. Nunca era tao fixe, era sempre uma coisa xata de montar que depois nem andava ou saltava ou mexia.
Pronto, é mais ao menos assim como me sinto agora, tou sempre abrir montes de ovos kinder e nunca recebo o que estou à espera. Pior que isso é quando se espera pelos ovos kinder gigantes que só aparecem na Páscoa, para receber aquele peluche lindo da televisão para poder gritar FELICIDADE como aquela crianças lorinhas.
Onde é que está o meu kinder Gran Sorpresa???????
24.2.09
20.1.09
por Joao Gil
era uma vez uma formiguinha, mas o narrador entretanto perdeu a linha de raciocinio então a formiguinha ficou parada à espera do narrador, mas o narrador nunca mais voltou e ela estava sozinha no campo, a tulzi. A formiguinha tulzi, era esse o seu nome.
primeiro sentiu-se só, mas depois percebeu: se não há narrador, então era finalmente ela a narrar a sua historia.
tulzi era finalmente livre, o seu corpo mexia-se apenas porque sim.
então a tulzi desatou a correr pelo campo fora!
correu, dançou, fez tchufa tchufa numa poça de agua e no fim do dia ficou a ver o por do sol.
para tulzi, não ter mais sentido era finalmente ter sentido.
7.1.09
E é ano novo há 7 dias. Assim como deus, já tivemos tempo de criar o mundo. Agora a sério vamos perceber que o ano novo é uma desculpa para tentar renascer.
Quando era miúda desenhava à vista horas a fio. Era mesmo difícil que ficasse perfeito, e se o desvio do original fosse irremediável amarrotava a folha e começava do início, assim como o ano novo. Amarrotamos 2008 e juramos que durante os próximo 365 dias vamos apagar uma linha e aplicar uma cor mais apropriada às aspirações.
Eles achavam que eu mentia, que copiava por cima. E ainda bem que não fui perfeita, porque a sobreposição dos esquissos comprovavam a minha arte. E de repente todos queriam um pedacinho do meu dom tão ternurento para uma menina tão pequenina e até então tao mentirosinha.
Este ano vou ser feliz na mesma. Vou ser feliz só por ter de apagar tantas vezes a nuvem demasiado assustadora ou a árvore desproporcional. Vou praguejar e encher os ouvidos de queixumes, bocejos e desisitir de mim uma e outra e mais outra vez. Para no fim, aceitar de novo que fiz mais um desenho, e que ficou quase igual.
Vou encher o meu peito para enaltecer as minhas qualidades e todas as horas desesperantes vão ser leves.
Enquanto o meu fim de ano se basear em "eu fui mais do que achei que ia ser", vou ser feliz.
14.12.08
Lembro me dum filme. 27ª edição do Fantasporto, vale a pena referir.
Era estranho e inquietantemente ordenado.
Um homem é levado para uma vida perfeita. Uma mulher cumpridora, submissa como se quer. Um emprego organizado, remuneração suficiente, sem excessos que perturbem o funcionamento linear.
Um dia esse indivíduo sem nome (far lhe ia jus um número, perdão, um mapa de bits), espera pelo metro.
Sabe se com precisão o tempo que o transporte demora a chegar.
Um casal beija se nos bancos brancos.
O som do beijo é mecãnico. Terrivelmente compassado.
O espectador já é o homem. O controlo dá vontade de morrer.
E ele suicida se. Um salto técnico. Pouco comovente, com geometria: momento exacto da chegada do metro.
E o filme torna se deliciosamente estupido e hilariante.
O homem não morre. Nao consegue. É probido morrer.
Ele deseja, persegue e implora a morte.
E o espectador, a dada altura, torce pela morte dele, como uma claque num jogo. Sugere tipos de mortes. Desanima quando o homem sem nome se levanta.
Naquele momento antes do fim, é encaminhado para a sua vida tecnicista. Para o seu pensamento esquadrizado.
No fim descobre musica. A musica era proibida. Veículos de emoção eram proibidos.
Mas ele descobre, a música e um cheiro a infância. Um qualquer, nao importa, todos temos um.
O homem sem nome teve de calcular a fuga.
Era uma vez um homem sem nome.
(comentário)
por Rui David Dias
Tenho pensado muito nesta questão. Porque andam os loucos hoje tão bem informados? Por serem loucos? Ou foi a informação que os enlouqueceu? Uma coisa é certa: a demência não impede um discurso articulado e crítico sobre o mundo. Impedi-lo-á a sanidade?
Quando não estamos informados, é sinal obvio que determinada informação sobre um assunto não nos chegou, e nesse momento permanecemos cheios. Digo cheios pois á medida que recebo mais e mais infomação sinto-me a tornar vazio, como que cada informação não me fosse adicionar nada mas sim retirar. Retira me a leveza que tenho quando permaneço conscientemente inconsciente. Gosto da sensação de estar inconsciente de viver na emoção, e cada vez mais procuro não me informar, não nas coisas mais profundas do ser em cada um de nós, mas nas coisas mais superficiais que com todos os dias somos atordoados. Coisas inuteis que guardamos todos os dias no pensamento e que todos os dias voltamos a guardar. Dou graças por adormecer todos os dias e nesse processo matar a informação, em cada dia cultivo a ideia que nasci de novo, tenho sempre consciencia do dia anterior, mas tento com que esse dia anterior, que já não existe, me manipule o dia em que estou a existir. O louco tem razão “Acabaremos também por ir lá parar!”,mas, enganou-se na frase "já estamos lá", não é iraque, mas estamos todos os dias em sacos de plástico mesmo sem estar-mos mortos, mas vivemos mortos quando num acto de protesto, ninguem protesta contra ele, por mais que fosse "esteja calado, quero dormir a caminho do trabalho."
Vivemos em sacos de plástico e ainda sobre a lei da fotográfia, e vamos continuar a viver porque esquecemos nos todos os dias que para além da visão e da racionalização existem milhões de formas de absorver o mundo, digo absover e não entender, entender significa racionalizar logo controlar e para mim obsessão de controle é puramente medo.
13.12.08
Sócrates: Vê agora o que aconteceria se eles fossem libertados das suas correntes e curados da sua desrazão. Tudo não aconteceria naturalmente como vou dizer? Se um desses homens fosse solto, forçado subitamente a levantar-se, a virar a cabeça, a andar, a olhar para o lado da luz, todos esses movimentos o fariam sofrer; ele ficaria ofuscado e não poderia distinguir os objectos, dos quais via apenas as sombras anteriormente. Na sua opinião, o que é que ele poderia responder se lhe dissessem que, antes, ele só via coisas sem consistência, que agora ele está mais perto da realidade, voltado para objectos mais reais, e que está a ver melhor? O que responderia se lhe designassem cada um dos objectos que desfilam, obrigando-o com perguntas, a dizer o que são? Não acha que ele ficaria embaraçado e que as sombras que ele via antes lhe pareceriam mais verdadeiras do que os objectos que lhe mostram agora?
Glauco: Certamente, elas lhe pareceriam mais verdadeiras.
Sócrates: E se o forçassem a olhar para a própria luz, não achas que os olhos lhe doeriam, que ele viraria as costas e voltaria para as coisas que pode olhar e que as consideraria verdadeiramente mais nítidas do que as coisas que lhe mostram?
Glauco: Sem dúvida alguma.
por Paulo Moura
"O homem entrou no metro mas não começou logo. Esperou que pensassem que era um utente normal. Então lançou, aos gritos: “Mais 20 mil soldados para o Iraque? Vão regressar todos em sacos de plástico. Todos!” Estava a falar com alguém? Não. Gritava para quem quisesse ouvir. “Acabaremos também por ir lá parar!” E continuou, sem baixar o volume, num discurso ininterrupto, como se se dirigisse a uma plateia interessada. E talvez fosse o caso.
O homem tinha a barba por fazer e vestia roupas sujas e rotas. Levou escassos segundos a que os passageiros o classificassem mentalmente como um “louco do metro”. Como tantos outros do género, no metro de Lisboa. Entram numa estação, fazem um discurso e saem na seguinte. Ninguém reage, obviamente. Ninguém o interrompe para dizer “desculpe, não concordo inteiramente com esse ponto…”. Também ninguém diz: “Cale-se, que me está a incomodar”. As pessoas evitam até cruzar o olhar com o dele. Se identificasse um interlocutor, o homem poderia desatar a falar para ele, a fazer-lhe perguntas, ou a insultá-lo, o que seria muito embaraçoso. Ou poderia mesmo desferir-lhe um murro certeiro no nariz, caso lhe ocorresse interpretar o silêncio aflito do transeúnte como prova irrefutável da sua conivência com a política de Bush para o Iraque.
Era um louco do metro e portanto o melhor era não ligar. Falou mais um pouco sobre o Iraque e depois passou para a reforma da administração pública em Portugal, não sem antes se deter brevemente no problema do nuclear do Irão. Podia ser maluco, mas não havia dúvidas de que estava muito bem informado. Mais do que as pessoas normais.
Lembrei-me de entrevistas que ouvi do Gato Fedorento ou dos redactores do Contra-Informação, em que descrevem o seu método de trabalho: sentam-se todas as manhãs a uma mesa, com a imprensa do dia, e estudam as notícias e os temas sobre os quais vão depois construir o discurso humorístico. Será que o maluco do metro faz o mesmo? Começa a manhã com uma pesquisa exaustiva em jornais e revistas, na internet, em livros especializados, sublinhando, tirando notas, para depois elaborar o seu discurso louco do dia?
Tenho pensado muito nesta questão. Porque andam os loucos hoje tão bem informados? Por serem loucos? Ou foi a informação que os enlouqueceu? Uma coisa é certa: a demência não impede um discurso articulado e crítico sobre o mundo. Impedi-lo-á a sanidade?
Será a imposição de limites ao horizonte uma condição para a nossa saúde mental?
Ninguém sobreviveria se soubesse de tudo o que se passa no mundo. Hoje, as informações estão disponíveis em doses capazes de nos destruir. Não é possível compreender a sociedade global sem o recurso a teorias da conspiração, projectos terroristas, filosofias paranóicas. O nosso modelo axiológico apenas está preparado para o universo do indivíduo e do seu reduzido ângulo de visão. Não mais. Em todas as épocas há lendas sobre homens que subiram ao topo de uma montanha e enlouqueceram.
Talvez a ignorância seja, portanto, um recurso dos mais aptos. Fechamo-nos, por instinto de sobrevivência. A liberdade tornou-se um handicap evolutivo. Privilégio dos loucos, que só têm a perder uma audiência muda de curiosidade. “Cambada de estúpidos”, rosnou entre dentes o louco do metro antes de se apear na estação seguinte."
12.12.08
loucos versus humanos
Consistência mentirosa duma existência absoluta mas finita.
A matéria é tão sorrateira como o cancro.
Merecia morrer. Disse que devia morrer. Mas o medo.
Belo é o visceral. Quem abraça a verbalização orgâncica de algo tão visceral, tão único. É livre. Mas maldito.
Nao é preciso morrer. Só dormir melhor. E banhar de novo, lavar uma e outra vez as entranhas da solidão.
Espero à janela. A janela sobre algo que há de ser bonito um dia. Se quiser. Depende da luz.
Sim, como o impressionismo! Vou fotografar na alvorada, na canícula, ou nas chuvas. Um dia, se e souber esperar, há de ser lindo. Permaneço.
8.12.08
;
Orar. Um recurso individual para riscar as nossas máculas.
Mas orar nao basta, sou leiga em matéria de confissão.
Cidade de religião. Sofrer como um cristão.
Expulsa diariamente do paraíso.
Reservada a dedicar me torridamente a um cigarro duma porta de entrada, com um "proibido falhar" dactilografado.
Já pregava torga o culto da ovelha tresmalhada.
Mas pequei de novo, menti: deus nao me desiludiu.
6.12.08
Fico só aninhada, tonta, na espera vã. Mas já é de dia. Desaprendi a troçar de mim.
São várias as buscas por uma salvação um pouca mais justa, para uma desculpa mais honesta.
Os punhos estão cerrados, mesmo quando não noto. E dou conta só por breves instantes, para saber de que sou feita.
E de repente soa como uma ovação. Uma peça de teatro. As palmas abafadas mas impostas. Uma narrativa agradável e apartes que embriagam o discernimento.
Mas as didascálias confessam me que deus me abandonou.
Encanta me esta atribuição. O papel dramático. Os gritos chorados e sofridos.
Cansei do deslumbramento por causas. Cansei do existencialismo gratuito.
Nao quero sentir mais isto. Chega. Acabou. Assassinei os meus pierrots.
Vou dançar em cima de mim do começo, para me sentir mais e maior.
Vou abraçar me a cores. Sempre consciente que sou fascinante a preto e branco.
Ainda não penduramos o nosso lençol
De facto perdoei me no banho, enquanto apertava o corpo com as unhas de verniz lascado. Mesmo assim ainda femininas.
Tentei passar por mim outra vez, e fiz e refiz a tua trança vezes sem conta, para que te pudesses aceitar e amar um bocadinho mais na loucura dos dias.
Desfiz a trança na madrugada, talvez num acto de aceitação. Avançaste, não bem, mas firme, como avanças sempre.
Também gostava de ser melhor, de morrer duma boa maneira, atrevo me a dizer grandiosa.
Nao chores. Podes sempre chamar por mim e eu faço te sentir bonita.
Mas vou na mesma continuar a ser menos do que sonhei para mim.
28.11.08
Nao sei se é o calor da tua casa ou das tuas mãos que me fazem querer ficar quando me pedes para ficar. O conforto é demasiado tentador e as palavras sao tao o que quero ouvir..o que preciso de ouvir. Fico e durmo. Em paz, porque respiro melhor com o textura dos teus lençois. Ou será das tuas maos? Ou das tuas palavras.
Rendição. Quero manter me onde sempre estive. Como sempre fui. Distante e à margem. Quero que queiras sem pensares que quero..mas quereres à mesma. Não consigo. Só quero adormecer. Livre de tudo, de mim até. Pontas dos teus dedos nos meus olhos quentes. Brincas distraido com o desenho dos meus lábios a amar devagarinho queixas e mimos. E eu adormeço. So porque quero. Estás aqui.
Não estás, e desafiamo nos de novo.
Perdoamos os confrontos externos e confitos interiores. Cansamos das horas pesadas . E devolvemo nos de novo ao sono entre promessas pornográficas. Ja nao sei onde me deixei, aquela que sempre quis ser, que sempre quis que amassem.
Amas. So porque sou. e ja cortejas os meus ombros como antes das horas dificeis. Alivias a minha ansia. Cobres me de ti e das me amor sujo, tentadoramente tenso e violento.
Agora está tudo tao esmagadoramente calmo, sem os raros surtos de dádiva incondicional. Sem os despojos infantis das horas vazias. Sem as conversas de casa de banho e os segredos de alcova.
A minha alma está tao fria como a tua cama.
Nao adormeço
Branca de Neve e os 7 anões
Ao contrário do conto, já contava que estivessem sete no quarto. São anões, são pequenos. Não os ouve porque falam baixo, nem os vê porque não estão no seu campo de visão mais preguiçoso. E são pequenos outra vez, não chegam às coisas e já nao apetece ajudá-los, pelo menos não mais. Mas o local é bonito, é exterior a ela, alheio à casa. Não percebe se ele é amigável ou hostil. Se é sujo ou só desarrumado. Se barulhento ou apenas está vivo.
Isto é Nápoles.
Golfo amontoado de casa, lixo e cães de rua.
Paisagem cronológica, com camadas de adaptação. Liderada pelo Vesúvio, enfeitada por Capri. È prosaica, mas pouco humilde, pavoneia se na sua grelha de vielas demasiado estreitas, com demasiados estendais e janelas em demasia também. Esquinas de mafiosos. Motas com mulheres mal maquilhadas e brilhantes. Muita gente, muito diferente, muitas histórias. Cliché, mas bem suado nesta cidade. Carros atropelam se e abafam as pandeiretas das famílais ciganas que cantam, tocam e sorriem, todo o dia, à espera. As lojas são do dono, não do cliente, não importa a venda. Fecham se no negócio: presépios, brinquedos ancestrais, instrumentos de música. Cedo é escuro e também cedo nos é desenvendada a riqueza e o perigo. Italianos barrigudos, os dos filmes, com o gorro amarrotado, pousado na cabeça. Sorriem, um sorriso pouco benvindo, mas pouco inimigo também. Os imigrantes dão passadas maiores quando faz noite. E as avós gordas calam os putos e botam nos para dormir. Mas da fachada de elmo, o campo de visão preguiçoso, maior e mais acima, são apenas anões.
filhA do pAi
Não foi de propósito, encontrei-o na escrivaninha. Era pequeno e tinha uma capa em couro, o que era inédito para mim, um caderninho que cheirava a antigo e a aventura; daquelas que eu lia escondida debaixo dos lençóis. E tinha uma moldura de cornucópias douradas. Desculpa..Não resisti a abrir e tinha a tua letra. A tua letra docemente desenhada. Passei horas a fio a imitá-la. Rabisquei dezenas de folhas do meu caderno sem capa de couro para conseguir criar o teu abecedário. Nao consegui. Li o teu diário e era triste. Tinhas 15 anos e eu tinha 13. As páginas eram amareladas, e eu acreditei mesmo que nunca ia ser como tu, nem ia ter tanta coisa dentro de mim como tu tinhas, nem ia chorar tanto como tu choravas. Falavas do teu pai lá, e eu nao percebia, e dizias que tinhas medo...nunca te vi com medo. Falavas de amor, platónico como tudo o que é prazeroso na tua vida. E condenaste esse amor nas páginas do diário, e eu fixei até hoje que ele não existia para ti, e que aceitaste o léxico mundano e formas quotidianas como as tartes de maça e os cariocas. Fiquei tão triste, era criança, queria que aquela estória acabasse bem, e nem me apercebi que fazia tão parte da tua história. Sabes de quem falo, aquele, que tinha a morte nos olhos.. e que morreu. Sempre quis que tivesses ficado com ele, não sei porquê. Lembro me de mais coisas que queria, lembro me duma frase: "o ódio destilado no alambique da guerra". Soava tão bem, era tão barroco e exuberante. Desejei com todas as forças do meu ser escrever assim, e escrever assim com a tua letra..ia ficar tão lindo, pareceria uma iluminura, com aquelas maiúsculas autoritárias. Quis escrever como tu antes de saber sequer o que a frase significava. Um dia decidi, lambi os dedos e avancei as folhas do dicionário, como sempre me ensinaste, para saber o que era "alambique"..desculpa não sabia, e também não conhecia destilar. Senti que devia ter lido mais, tu bem dizias. Eu compreendi a frase, não a entendi. A clareza do entendimento veio mais tarde, e foi avassalador. Qualquer forma de escrita, nunca me vai atingir do mesmo modo que esta frase, porque nunca mais encontrei nada tão poderoso e que me fizesse sofrer tanto. Senti vergonha por entender o tipo de ódio a que te referias. Foi o primeiro objectivo da minha vida, daquelas pequenas ocorrências da infância, as que ficam. Escrever como tu, conseguir extrair mais da língua do que o que ela própria oferece. Este foi o primeiro e mais puro entendimento da minha existência intelectual e emocional. Quis te descobrir mais, mas és tão distante mãe, quis ouvir a Paixão Segundo S.Mateus de Bach, e depois de ouvi-la quis aprender a ouvi-la, houve alturas, aliás, que, para te combater, ouvi incessantemente a Paixão Segundo S. João, só para me provar que não somos iguais. Mas a Paixão Segundo S. Mateus é mais bela, e mais sofrida como tu. Depois percebi a tua missão, percebi que não conseguiste viver mais depois que eu nasci, ou se calhar depois que ele morreu, ou então nunca conseguiste viver. Porque és tão magnânima e exterior a ti? O mundo não tem de depender de ti. Quando morreres as flores não vão desabrochar do mesmo modo. Ninguém disse isto, nem ao Pessoa nem ao Campos. Eu sou o teu ponto de referência, mas quero deixar de ser. Porque achas que eu te afasto mas que preciso de ti? Mãe, es tao sábia com as palavras e o léxico pregou te uma partida. Eu aproximo te, e preciso te. Mas tens de descer a mim. Nao! Tens de me deixar subir a ti. Tornares tudo plano, sem quebras ou vacilos, só para eu entrar um pouco no teu mundo e passares tu a ser o meu ponto de referência e menos a tal ocorrência de infância. És tu para todos. Desgastas-te para seres de todos, e todos têm espaço para serem mais deles. E todos os dias és menos de ti e para ti. Nao deixes mãe. Escreve o teu livro. Tu achas que não tens autoridade. Ganha essa vitória a ti mesma, permite te a entregares-te sem almofadas, tintas ou pérolas. Plantamos uma árvore juntas.
Ensinaste me a escrever, agora eu ensino te a ti.
por Ines Andrade
"epitáfio aka ode à vida": nao encontro conceitos que se enquadrem melhor neste cenário que pintaste em correria por mim. Por mim porque sei que o sentiste, como sentirias se eu aí estivesse, a pintar os olhos debaixo da luz fraca da tua casa de banho como quando eramos crianças. O'neill verbalizou os meus medos..defendo me da morte, mas se, ou quando ela chegar, so tu terás o dom da palavra para a despedida.
Aprender é descobrir o que já sabias. E descobri em Assisi uma paz que pensei pertencer só a mim (que egoísmo eu sei) mas aprendi que a fé existe e que nao precisa de tapete de entrada. Aprendi que a minha mãe tem razao, sou uma rapariga da cidade, cuja obstinação so me defende das coisas erradas, mas encontrei em Assisi a verdade. Na cidade nao me sinto capaz de escrever um livro. Em Assisi sei que vou escrever um livro.
Nao aprendi a (des)esperar, ja quero escrever um livro sem ter plantado a àrvore e feito o filho..Desculpa, mas quando escrevo estou no meu campo de batalha, daquela que falas que travamos? Bom, domino quando escrevo, e nao estar aí, onde o ar é despretensioso, fez me perder esse controlo. E se eu nao souber escrever mais? Se nao souber desafiar mais a lingua que sempre foi minha? Até ela vai mudar, mariana, até a nossa lingua vai abandonar as minhas mãos e eu nao vou poder contar pelos dedos os pormenores, as acções e as pessoas que me pertencem.
Nao sei plantar uma árvore, preciso mesmo que me ensines, sim? O filho é mesmo a verdadeira criação, surpreende-te, ama te e mata te. Um livro não, o livro é branco, mari, e tu dás lhe ordens, guardas, riscas, rasgas, desistes, retomas. Um filho não admite prefácios e o único "marcador" que algum dia terás serão desenhos de primária.
Mas voltemos à infancia que nao tivemos...
Dorothy, bate três vezes com os calcanhares para eu voltar para casa....
O filho e o livro
Os floristas abertos toda a noite, nas avenidas escuras dos arredores romanos, iluminam as esquinas com girassõis, rosas e orquídeas, para presentear amantes nas madrugadas.
A linha do 87, que apelidamos carinhosamente do autocarro turístico, que me acaricia pela manhã com as melhores visões de roma
Os gelados, são quase como a realização dum desejo infantil, sabores que, secretamente, sempre esperamos que existissem, e afinal existem mesmoimprevisibilidade da cidade, quando já pensamos que vimos tudo o que de importante há para ver, presunção nossa, ela mostra nos uma paisagem nova, quase sorrateira, de tao descontextualizada, mas que arranca um sorriso de conforto
Por fim, os testes a nós mesmos, não é uma característica directa de roma, mas que desencadeia acontecimentos só possíveis lá.
desvendem os vossos segredos
lugares comuns
19.12.07
Fashion Victims
O tradicional lenço quadriculado, o kaffiyeh, representa décadas de luta pelo território palestiniano, mas para a geração “morangos com açucar”, o lenço não evoca violência nem nacionalismo, não passa dum artefacto que combina com as all-stars rosa e os cintos Dolce&Gabbana. Depois de ateus a usarem santos ao pescoço, clientes assíduos do macdonald’s com imagens do Che, um anúncio da Nike com a “revolution” dos Beatles, só falta contrastar o lenço com a estrela de David. Cria-se um intenso paradoxo entre um símbolismo ideológico e um comportamento consumista próprio do sistema capitalista.
Em voga está o “bandit look”. “Bandit look”? Vende-se um estilo rebelde e revolucionário para preencher o vazio duma sociedade que demitiu os heróis; uma sociedade em declínio, sem aspirações ou soluções, que se apropria dos ideais alheios desapropriando-os dos seus propósitos? Geração enganada voluntariamente, presa num argumento de vídeo-clip sem conteúdo, onde a próxima conquista passa por conseguir uma “espécie de lenço TALIBAN” (preto, vermelho, azul ou verde), a combinar com o cardigan cinzento. Um lenço “versátil” para todas as ocasiões, com o “padrão” adequado para as bebedeiras (atipicamente muçulmanas) e o estilo “étnico” exigido nesta colecção. Os miúdos estão-se realmente a “borrifar” para lutas ideológicas desde que consigam “guest” para a discoteca; e vê-los em manifestações só se houver cerveja à borla. Nesta geração “copy/paste” o que todos usam tem de se adquirir, e assim lá andam eles, com o lenço ao pescoço, o lenço cuja função na Palestina é proteger a cabeça do sol, e os olhos do pó. Pó e areia que a população juvenil ocidental lhes atira.
“Yasser Arafat sabia que os ícones se fazem de outros ícones, de imagens permanentes que entram no imaginário como símbolos inapagáveis”, o que ele não sabia é que, da mesma maneira que o Che Guevara acabou estampado em t-shirts de 1.50€, o kaffiyeh seria o último grito das “fashion victims”; vítimas sim, duma sociedade egoísta e nada preocupada com os telhados de vidro dos vizinhos, ou com as “pedras” que uns e outros atiram.
30.11.07
Licenciado em Artes Plásticas pela Faculdade de Belas Artes do Porto, Frederico considera que “ as minhas peças são vitais para mim e presumo que um reflexo natural da minha pessoa”.
A oportunidade de colaborar no projecto dos Blasted Mechanism surgiu de “um acaso do destino” visto que o mentor do grupo, Valdjiu, lhe telefonou por engano para o telemóvel e partir daí criaram uma “relação muito frutuosa”. “No momento desse contacto os Blasted já possuíam ilustrações da sua nova imagem realizados pelo ilustrador Ricardo Venâncio. A partir dessas imagens realizei a concepção plástica dos fatos tendo tentado dar plasticidade e vida a uma estética que curiosamente tem muito a ver com o meu imaginário, tendo resultado assim num trabalho extremamente gratificante a vários níveis.”
" A ligação às artes surgiu duma maneira muito natural". Optou pela área artística no último ano do secundário, até aí, o percurso académico esteve associado à engenharia, nomeadamente mecânica. O cariz tecnicista do agrupamento proporcionou-lhe conhecimentos fundamentais que transparecem no seu trabalho actual.
A aprendizagem real e a afirmação como artista no meio começaram fora da faculdade:" aprendi “TUDO”, aprendi a importância de vivermos abertos para recebermos o mundo e ficarmos agradecidos por isso".
Receptivo à mudança e à inovação Frederico desde cedo participou em exposições colectivas nos
O lançamento da sua obra levou ao reconhecimento do seu potencial. Em 2005 ganhou o 1º prémio no Concurso Nacional de Escultura Art’s Business & Hotel Center, em Lisboa, com a escultura Silent Blow, uma metáfora do seu voo como artista: "Silent Blow ou sopro silencioso remete-me para a possibilidade de elevação através de uma brisa silenciosa que nos faz pairar acima de algo terreno". A escultura é" uma evolução natural de uma sela de montar da qual se desenvolve um par de asas que a qualquer momento nos permitirá essa elevação".
Esta consagração definiu os traços actuais da sua obra, orgânica, sensual, descomprometida; "onde a ideia e as imagens mentais regem totalmente o seu trabalho". "Tudo é realizado em função de um imaginário que aos poucos" vai "conhecendo melhor", assim, "os materiais vão-se seleccionando e organizando criando uma forma funcional que se aproxima da imagem mental original".
Mas esse imaginário não se entrega só a peças a fluidas e suaves. A colecção Interfaces, exposta em 2005 na Este registo, esta "motivação de reflectir sobre a capacidade de potenciação que os
instrumentos tecnológicos nos permite está", também, presente no seu trabalho. Na peça “The Possibility of Death at Your Own Fingertips”, um volante dum automóvel onde se fundem dois revólveres, Frederico aposta numa reflexão sobre a tecnologia como prótese do ser humano.
Actualmente Frederico, 30 anos, vive e trabalha no Porto, alternando em visitas a Lisboa. Lecciona Desenho e Figura Humana no curso de Design de Moda e é professor de Design Básico no Citex.
Colabora na galeria Exteril, uma criação de Teixeira Barbosa à qual pertencem 18 artistas.
No próximo dia 15 a Exteril vai organizar o evento 15’m de fama, no qual Frederico terá 15 minutos para montar, apresentar e desmontar um projecto.
in remorso de baltazar serapião
(valter hugo mãe)
29.11.07
caça às bruxas
o que me espanta não é a extravagância do acto em si. duas coisas me parecem muito piores. em primeiro, a facilidade com que em todo o ocidente o estado resolveu intervir na vida privada de cada um negar radicalmene o direito de propriedade (ipedindo, por exemplo, que se criem restaurantes de fumadores), sem um protesto sério em parte alguma, em segundo lugar, a rapidez co que o fumador foi socialmente estigmatizado e o vício de fumar ( há 20 anos, normal e aceitável) se tornou quase o que era antigamente uma blasfémia, uma profanação ou uma heresia. isto não anuncia nada de bom. ´(...) já se viu que o poder do estado para converter a populaça ao objectivo tenebroso de melhorar o homem é hoje ilimitado. a metamorfose das democacias do ocidente em totalitarismos de uma nova espécie não incomoda ninguém para hitler (que nao fumava nem bebia) o alemão perfeito não andava longe do perfeito espécime do ocidente contemporãneo. imagino muitas vezes quem, de facto, quererá este mundo sufocante, asséptico, obcecado com a "saúde"? gente, como é óbvio, com pouca imaginação.
Vasco Pulido Valente Público 9.11.07
a busca ao paradigma exemplar do homem perfeito nao pára.
a oferta constante duma vida regrada, disciplinada que trará longevidade é perigosa
além do tabaco, do alcool, das drogas, da obesidade há também
orgulho hetero da tagus
ou diremos antes
orgulho de ser homofóbico
o que se passa?
será que este tipo de comportamento passou a ser de tal modo aceitável que uma empresa consiga conceber a ideia de que a imagem projectada da marca vai melhorar?
é necessátio redefinir valores, perderam-se, e perdeu-se a garra de lutar por tais valores.
todos escrevem, todos são "livres de se mnaifestar contra ou a favor" deste tipo de campanhas, mas na aldeia global em que vivemos essa liberdade dipersa-se no maior meio de comunicação: a internet.
o contacto e a comunicação estão num limite nunca antes visto e a informação é ilimitada. as pessoas isolam-se e a individualidade torna todos estes acontecimentos obsoletos e reversíveis
27.4.07
PoeSia orGasmO
se faz a escrita. não se faz um verso.
tem de correr no corpo dos poemas
o sangue das artérias do universo.
cada palavra há-de ser um grito.
um murmurio um gemido uma erecção
que transporte do humano ao infinito
a dor o fogo a flor a vibração.
a poesia é de mel ou de cicuta?
quando um poeta se interroga e escuta
ouve ternura luta espanto ou espasmo?
ouve como quiser seja o que for
fazer poemas é escrever amor
a poesia o que tem de ser é orgasmo.
Ary dos Santos
livro de horas
aqui diante de mim, eu, pecador, me confesso de ser assim como sou. me confesso o bom e o mau que vão ao leme da nau nesta deriva em que vou. me confesso possesso das virtudes teologais, que são três, e dos pecados mortais, que são sete, quando a terra não repete que são mais. me confesso o dono das minhas horas, o dos facadas cegas e raivosas, e o das ternuras lúcidas e mansas. e de ser de qualquer modo andanças do mesmo todo. me confesso de ser charco e luar de charco, à mistura. de ser a corda do arco que atira setas acima e abaixo da minha altura. me confesso de ser tudo que possa nascer em mim. de ter raízes no chão desta minha condição. me confesso de abel e de caim. me confesso de ser homem. de ser um anjo caído do tal céu que deus governa; de ser um monstro saído do buraco mais fundo da caverna. me confesso de ser eu. eu, tal e qual como vim para dizer que sou eu aqui, diante de mim!
Miguel Torga
editar vida
"escrevi este livro na felicidade louca de escrevê lo"