21.1.10

abreviatura de algo gigante

E no dia seguinte já não chovia. Os vultos motivados pela cortesia haviam dispersado e restávamos apenas nós, os que realmente conheciam de cor o teu humor negro. No dia anterior achei que tinhas medo de ficar sozinha, esmagada por aquela colina geométrica de mármore rugosa, ontem tão ameaçadora, hoje mais aceite. Ausentei-me por momentos, também já não estavas ali e não, de que adiantava. As gavetas transformaram-se em janelas e pensei o quanto arquivada ficou a tua história. Devia existir uma biblioteca de almas que reunisse todas as estórias do mundo, principalmente a tua, tão kármica. Mantenho-me durante uns minutos mais neste espaço de segurança e sinto aquela pele infantil de tão tépida ingenuidade que permaneceu até ao final. O sarcasmo fugitivo o olhar assustado tudo agora tão sereno mas estampado a encarnado nas minhas memórias. Um derradeiro beijo na testa para afastar a dor e colocar em câmara lenta o dia em que entras na minha vida, qual mãe natal disfuncional, para trazer a alegria de criança à minha existência. No próximo dia encontramo-nos, espera-me no paraíso que até lá vou pintar os lábios de vermelho para te trazer de volta.

21.7.09

disseste que me amavas e que querias casar-te já amanha. eu, como é óbvio rejeitei e tu soltaste uma lágrima bem barulhenta. No entanto disse que seria sempre teu amigo e que estava disposto a ser teu menino das alianças quando te casasses com alguém mais interessante do q eu... voltaste a soltar uma lágrima, mas desta vez quem se fez ouvir foi o teu sorriso

por Barros, André

16.7.09

"Dispidida"


A ouvir Mayra Andrade numa manhã de férias, mais trabalhosas do que o próprio labutar. Dançar de pés descalços na mármore fria e sentir, envergonhada, a face mais animalesca e literalmente bestial da minha existência. Tenho de transpor essa barreira e garantir uma aproximação do que é conceptualmente humano e que permite elos com algo mais deles, os humanos, e menos meu. Hipocrisia, talvez, mas eu ou eles?


"Mórna k-um konxéInda mininu na regasu Na óra di dispidida um kré també Uvi-b oh morna !Bo seiva,Invadi-m nha korasom sem limit."


Lá continua ela a cantar, menos humana e mais divina. Sagrada companheira das horas solitárias: as melhores mas incompletas. Rodear me de sons e de flores, cobrir me de vantagens e planos sonhadores, sempre possíveis para mim. Delirar comigo e com o outro e com mais alguém, com quem entra e tem coragem para ficar, com quem sai desprovido de vontades de guerrilha e naufrágio.

Contextos atrás de contextos, estórias atropelam se e esquecem se de formar história... e eu, arrebatada no meio disto, mantenho me sem me recolher, masoquista dum restolho que adivinha um início.

Confiro um sentido em papel, lista e agenda, materializo o melhor de mim em post its e mensagens de rua. Rabisco aqui e dentro de mim a "inês das mil e uma verdades" e a inês das mil uma certezas. Fica por saciar a inês dos mil e um mimos.


Embriagada de mim fico por aqui, e fica por entender " a inês".

30.6.09

Ultrapasso me
Rio
Choro
Desvalorizo me
Exagero
Aceito

Pausa

26.6.09

Ponto de Referência de Quem Sou

Cruz na porta da tabacaria!
Quem morreu? O próprio Alves? DouAo diabo o bem-’star que trazia.
Desde ontem a cidade mudou.
Quem era? Ora, era quem eu via.
Todos os dias o via. Estou Agora sem essa monotonia.
Desde ontem a cidade mudou.
Ele era o dono da tabacaria.
Um ponto de referência de quem sou.
Eu passava ali de noite e de dia.
Desde ontem a cidade mudou.
Meu coração tem pouca alegria, E isto diz que é morte aquilo onde estou.
Horror fechado da tabacaria!Desde ontem a cidade mudou.
Mas ao menos a ele alguém o via,Ele era fixo, eu, o que vou,
Se morrer, não falto, e ninguém diria:
Desde ontem a cidade mudou.
Álvaro de Campos

18.4.09

Untitled

Pensei bastante sobre a vida. Um assunto que, apesar de na boca do povo ("vida de cão"´"é a vida" "como vai a vida"), ninguém se digna realmente a pensar. E o tempo é sempre simultaneamente amigo e inimigo. Atenua as más lembranças, aquelas que achamos mesmo que desapareceram, mas que ainda se revelam em sonhos e noites mal passadas.
De facto aprender e apreender são as acções mais genuínas que podemos executar. Aprender a viver connosco, e com o que a tal vida nos vai atirando para as costas, é uma formação que não temos. Quando aprendemos que não somos as mesmas pessoas que éramos, que a felicidade não é um estado constante, mas continuado, e que, enquanto uns ficam à espera de momentos e outros ficam à espera de oportunidades, nós deambulamos por espaços que nos pareçam familiares, que se nos avizinhem confortáveis ou minimamente acolhedores, e somos felizes aos poucos nesses espaços.
E as pessoas, também, pontos que entram e saem do nosso quadrado porque querem, outras porque as afastamos, outras ainda porque não conseguem enxergar quando o nosso quadrado é escuro. E tem aquelas que estão sempre por perto, para quem o nosso quadrado é a casa delas, e, mesmo sem luz, sabem onde estão as directrizes que nos definem.
A vida dá lições... e dá mesmo. Há comodistas que acham que a vida os fode, há egoístas que acham que a vida não lhes pertence, há pessimistas que sacam dela o pior, há optimistas que a levam pouco a sério e há os que não se conformam, os que não têm medo de tentar.
Há bofetadas, é verdade, mas as lições que mais nos marcam são as de bondade, são as retribuições, as dádivas que ela oferece mesmo sem merecermos, mas que iremos merecer porque ela nos ensinou com abraços e presenças.
Se aprendi alguma coisa da vida foi que não foi ela a ensinar-me.

16.4.09

12.4.09

Adornos

“Depois de algum tempo aprendes a diferença, a subtil diferença, entre dar a mão e acorrentar uma alma. E aprendes que amar não significa apoiar-se, e que companhia nem sempre significa segurança. E começas a aprender que beijos não são contratos e presentes não são promessas. E começas a aceitar as tuas derrotas com a cabeça erguida e os olhos adiante, com a graça de uma criança e não com a tristeza de um adulto. (...) Aprendes que não importa em quantos pedaços o teu coração foi partido, o mundo não pára para que o concertes. Aprendes que o tempo não é algo que possa voltar para trás. Portanto, planta o teu jardim e decora a tua alma, ao invés de esperar que alguém te traga flores. E aprendes que realmente podes suportar... que realmente és forte, e que podes ir muito mais longe depois de pensares que não podes mais. E que realmente a vida tem valor e que tu tens valor diante da vida! As nossas dúvidas são traidoras e fazem-nos perder o bem que poderíamos conquistar, se não fosse o medo de tentar.”

William Shakespeare

6.4.09

e dopo la vita solo rimana l'amore

25.3.09

É impossível parar a evolução. Fui ver um concerto. Como em todos os concertos houve músicas mexidas e músicas paradas. Como em todos os concertos nas músicas paradas toda a gente estende a chama dos isqueiros e embala o espírito. Mas afinal não, desta vez não. Desta vez toda a gente levantou os telemóveis, um céu tecnológico, uma plateia mecanizada, azul, fria. Foi horrível, apeteceu me chorar chorar chorar. Há coisas que se perdem mesmo. E ninguém dá por nada.. e agora que não há ovações quentes onde me vou enquadrar? O homem descobriu o fogo e depois o telemóvel. Antes, sim antes, todos sabíamos que todos estavámos a sentir o mesmo e todos pelo mesmo objectivo. Agora, e infelizmente é agora e depois, vou procurar na multidão quem acenda o isqueiro comigo e sentir me solidária.

16.3.09

Kinder Drama
Apetece me fazer um breve ensaio sobre os ovos kinder. Ovo surpresa, hmm que sabia bem porque era a porta para a descoberta. Mas a surpresa nunca era a que dava na televisão ou a que aparecia na caixa. Nunca era tao fixe, era sempre uma coisa xata de montar que depois nem andava ou saltava ou mexia.
Pronto, é mais ao menos assim como me sinto agora, tou sempre abrir montes de ovos kinder e nunca recebo o que estou à espera. Pior que isso é quando se espera pelos ovos kinder gigantes que só aparecem na Páscoa, para receber aquele peluche lindo da televisão para poder gritar FELICIDADE como aquela crianças lorinhas.
Onde é que está o meu kinder Gran Sorpresa???????

24.2.09

Espirrei. Agora já sei que espirrar é como voltar para casa. Primeiro uma sensação incómoda, um desconforto amigável. Depois o suspense, e engana que está perto, vai e volta. Depois percebemos que é desta, "vou mesmo espirrar", e de repente a ascensão, uma liberdade como um sacudir de alma. Resta o conforto caloroso, duma casa limpa com cheiro de frescura.

20.1.09

a formiguinha tulzi
por Joao Gil

era uma vez uma formiguinha, mas o narrador entretanto perdeu a linha de raciocinio então a formiguinha ficou parada à espera do narrador, mas o narrador nunca mais voltou e ela estava sozinha no campo, a tulzi. A formiguinha tulzi, era esse o seu nome.
primeiro sentiu-se só, mas depois percebeu: se não há narrador, então era finalmente ela a narrar a sua historia.
tulzi era finalmente livre, o seu corpo mexia-se apenas porque sim.
então a tulzi desatou a correr pelo campo fora!
correu, dançou, fez tchufa tchufa numa poça de agua e no fim do dia ficou a ver o por do sol.
para tulzi, não ter mais sentido era finalmente ter sentido.

7.1.09

a insustentável leveza do ser

E é ano novo há 7 dias. Assim como deus, já tivemos tempo de criar o mundo. Agora a sério vamos perceber que o ano novo é uma desculpa para tentar renascer.
Quando era miúda desenhava à vista horas a fio. Era mesmo difícil que ficasse perfeito, e se o desvio do original fosse irremediável amarrotava a folha e começava do início, assim como o ano novo. Amarrotamos 2008 e juramos que durante os próximo 365 dias vamos apagar uma linha e aplicar uma cor mais apropriada às aspirações.
Eles achavam que eu mentia, que copiava por cima. E ainda bem que não fui perfeita, porque a sobreposição dos esquissos comprovavam a minha arte. E de repente todos queriam um pedacinho do meu dom tão ternurento para uma menina tão pequenina e até então tao mentirosinha.
Este ano vou ser feliz na mesma. Vou ser feliz só por ter de apagar tantas vezes a nuvem demasiado assustadora ou a árvore desproporcional. Vou praguejar e encher os ouvidos de queixumes, bocejos e desisitir de mim uma e outra e mais outra vez. Para no fim, aceitar de novo que fiz mais um desenho, e que ficou quase igual.
Vou encher o meu peito para enaltecer as minhas qualidades e todas as horas desesperantes vão ser leves.
Enquanto o meu fim de ano se basear em "eu fui mais do que achei que ia ser", vou ser feliz.

14.12.08

aprender a rezar na era da técnica

Lembro me dum filme. 27ª edição do Fantasporto, vale a pena referir.
Era estranho e inquietantemente ordenado.
Um homem é levado para uma vida perfeita. Uma mulher cumpridora, submissa como se quer. Um emprego organizado, remuneração suficiente, sem excessos que perturbem o funcionamento linear.
Um dia esse indivíduo sem nome (far lhe ia jus um número, perdão, um mapa de bits), espera pelo metro.
Sabe se com precisão o tempo que o transporte demora a chegar.
Um casal beija se nos bancos brancos.
O som do beijo é mecãnico. Terrivelmente compassado.
O espectador já é o homem. O controlo dá vontade de morrer.
E ele suicida se. Um salto técnico. Pouco comovente, com geometria: momento exacto da chegada do metro.


E o filme torna se deliciosamente estupido e hilariante.
O homem não morre. Nao consegue. É probido morrer.
Ele deseja, persegue e implora a morte.
E o espectador, a dada altura, torce pela morte dele, como uma claque num jogo. Sugere tipos de mortes. Desanima quando o homem sem nome se levanta.

Naquele momento antes do fim, é encaminhado para a sua vida tecnicista. Para o seu pensamento esquadrizado.
No fim descobre musica. A musica era proibida. Veículos de emoção eram proibidos.
Mas ele descobre, a música e um cheiro a infância. Um qualquer, nao importa, todos temos um.

O homem sem nome teve de calcular a fuga.
Era uma vez um homem sem nome.
323 palavras

(comentário)

por Rui David Dias



Tenho pensado muito nesta questão. Porque andam os loucos hoje tão bem informados? Por serem loucos? Ou foi a informação que os enlouqueceu? Uma coisa é certa: a demência não impede um discurso articulado e crítico sobre o mundo. Impedi-lo-á a sanidade?

Quando não estamos informados, é sinal obvio que determinada informação sobre um assunto não nos chegou, e nesse momento permanecemos cheios. Digo cheios pois á medida que recebo mais e mais infomação sinto-me a tornar vazio, como que cada informação não me fosse adicionar nada mas sim retirar. Retira me a leveza que tenho quando permaneço conscientemente inconsciente. Gosto da sensação de estar inconsciente de viver na emoção, e cada vez mais procuro não me informar, não nas coisas mais profundas do ser em cada um de nós, mas nas coisas mais superficiais que com todos os dias somos atordoados. Coisas inuteis que guardamos todos os dias no pensamento e que todos os dias voltamos a guardar. Dou graças por adormecer todos os dias e nesse processo matar a informação, em cada dia cultivo a ideia que nasci de novo, tenho sempre consciencia do dia anterior, mas tento com que esse dia anterior, que já não existe, me manipule o dia em que estou a existir. O louco tem razão “Acabaremos também por ir lá parar!”,mas, enganou-se na frase "já estamos lá", não é iraque, mas estamos todos os dias em sacos de plástico mesmo sem estar-mos mortos, mas vivemos mortos quando num acto de protesto, ninguem protesta contra ele, por mais que fosse "esteja calado, quero dormir a caminho do trabalho."
Vivemos em sacos de plástico e ainda sobre a lei da fotográfia, e vamos continuar a viver porque esquecemos nos todos os dias que para além da visão e da racionalização existem milhões de formas de absorver o mundo, digo absover e não entender, entender significa racionalizar logo controlar e para mim obsessão de controle é puramente medo.


13.12.08

O louco global oppure alegoria da caverna


Sócrates: Vê agora o que aconteceria se eles fossem libertados das suas correntes e curados da sua desrazão. Tudo não aconteceria naturalmente como vou dizer? Se um desses homens fosse solto, forçado subitamente a levantar-se, a virar a cabeça, a andar, a olhar para o lado da luz, todos esses movimentos o fariam sofrer; ele ficaria ofuscado e não poderia distinguir os objectos, dos quais via apenas as sombras anteriormente. Na sua opinião, o que é que ele poderia responder se lhe dissessem que, antes, ele só via coisas sem consistência, que agora ele está mais perto da realidade, voltado para objectos mais reais, e que está a ver melhor? O que responderia se lhe designassem cada um dos objectos que desfilam, obrigando-o com perguntas, a dizer o que são? Não acha que ele ficaria embaraçado e que as sombras que ele via antes lhe pareceriam mais verdadeiras do que os objectos que lhe mostram agora?

Glauco: Certamente, elas lhe pareceriam mais verdadeiras.


Sócrates: E se o forçassem a olhar para a própria luz, não achas que os olhos lhe doeriam, que ele viraria as costas e voltaria para as coisas que pode olhar e que as consideraria verdadeiramente mais nítidas do que as coisas que lhe mostram?


Glauco: Sem dúvida alguma.

O LOUCO GLOBAL
por Paulo Moura

"O homem entrou no metro mas não começou logo. Esperou que pensassem que era um utente normal. Então lançou, aos gritos: “Mais 20 mil soldados para o Iraque? Vão regressar todos em sacos de plástico. Todos!” Estava a falar com alguém? Não. Gritava para quem quisesse ouvir. “Acabaremos também por ir lá parar!” E continuou, sem baixar o volume, num discurso ininterrupto, como se se dirigisse a uma plateia interessada. E talvez fosse o caso.

O homem tinha a barba por fazer e vestia roupas sujas e rotas. Levou escassos segundos a que os passageiros o classificassem mentalmente como um “louco do metro”. Como tantos outros do género, no metro de Lisboa. Entram numa estação, fazem um discurso e saem na seguinte. Ninguém reage, obviamente. Ninguém o interrompe para dizer “desculpe, não concordo inteiramente com esse ponto…”. Também ninguém diz: “Cale-se, que me está a incomodar”. As pessoas evitam até cruzar o olhar com o dele. Se identificasse um interlocutor, o homem poderia desatar a falar para ele, a fazer-lhe perguntas, ou a insultá-lo, o que seria muito embaraçoso. Ou poderia mesmo desferir-lhe um murro certeiro no nariz, caso lhe ocorresse interpretar o silêncio aflito do transeúnte como prova irrefutável da sua conivência com a política de Bush para o Iraque.

Era um louco do metro e portanto o melhor era não ligar. Falou mais um pouco sobre o Iraque e depois passou para a reforma da administração pública em Portugal, não sem antes se deter brevemente no problema do nuclear do Irão. Podia ser maluco, mas não havia dúvidas de que estava muito bem informado. Mais do que as pessoas normais.

Lembrei-me de entrevistas que ouvi do Gato Fedorento ou dos redactores do Contra-Informação, em que descrevem o seu método de trabalho: sentam-se todas as manhãs a uma mesa, com a imprensa do dia, e estudam as notícias e os temas sobre os quais vão depois construir o discurso humorístico. Será que o maluco do metro faz o mesmo? Começa a manhã com uma pesquisa exaustiva em jornais e revistas, na internet, em livros especializados, sublinhando, tirando notas, para depois elaborar o seu discurso louco do dia?

Tenho pensado muito nesta questão. Porque andam os loucos hoje tão bem informados? Por serem loucos? Ou foi a informação que os enlouqueceu? Uma coisa é certa: a demência não impede um discurso articulado e crítico sobre o mundo. Impedi-lo-á a sanidade?

Será a imposição de limites ao horizonte uma condição para a nossa saúde mental?
Ninguém sobreviveria se soubesse de tudo o que se passa no mundo. Hoje, as informações estão disponíveis em doses capazes de nos destruir. Não é possível compreender a sociedade global sem o recurso a teorias da conspiração, projectos terroristas, filosofias paranóicas. O nosso modelo axiológico apenas está preparado para o universo do indivíduo e do seu reduzido ângulo de visão. Não mais. Em todas as épocas há lendas sobre homens que subiram ao topo de uma montanha e enlouqueceram.

Talvez a ignorância seja, portanto, um recurso dos mais aptos. Fechamo-nos, por instinto de sobrevivência. A liberdade tornou-se um handicap evolutivo. Privilégio dos loucos, que só têm a perder uma audiência muda de curiosidade. “Cambada de estúpidos”, rosnou entre dentes o louco do metro antes de se apear na estação seguinte."



LUA
Há 15 anos que a Lua Cheia não estava tão perto da Terra. São 30 mil quilómetros a menos do que o normal.
In Publico



12.12.08

loucos versus humanos

Matéria. Doce congratulação do espírito.
Consistência mentirosa duma existência absoluta mas finita.
A matéria é tão sorrateira como o cancro.
Merecia morrer. Disse que devia morrer. Mas o medo.
Belo é o visceral. Quem abraça a verbalização orgâncica de algo tão visceral, tão único. É livre. Mas maldito.
Nao é preciso morrer. Só dormir melhor. E banhar de novo, lavar uma e outra vez as entranhas da solidão.

Espero à janela. A janela sobre algo que há de ser bonito um dia. Se quiser. Depende da luz.
Sim, como o impressionismo! Vou fotografar na alvorada, na canícula, ou nas chuvas. Um dia, se e souber esperar, há de ser lindo. Permaneço.

8.12.08

paixao segundo mortais
;

Orar. Um recurso individual para riscar as nossas máculas.
Mas orar nao basta, sou leiga em matéria de confissão.
Cidade de religião. Sofrer como um cristão.
Expulsa diariamente do paraíso.
Reservada a dedicar me torridamente a um cigarro duma porta de entrada, com um "proibido falhar" dactilografado.
Já pregava torga o culto da ovelha tresmalhada.
Mas pequei de novo, menti: deus nao me desiludiu.

6.12.08

V e r m e l h o é p a r a p a r a r n

Fico só aninhada, tonta, na espera vã. Mas já é de dia. Desaprendi a troçar de mim.
São várias as buscas por uma salvação um pouca mais justa, para uma desculpa mais honesta.
Os punhos estão cerrados, mesmo quando não noto. E dou conta só por breves instantes, para saber de que sou feita.
E de repente soa como uma ovação. Uma peça de teatro. As palmas abafadas mas impostas. Uma narrativa agradável e apartes que embriagam o discernimento.

Mas as didascálias confessam me que deus me abandonou.
Encanta me esta atribuição. O papel dramático. Os gritos chorados e sofridos.

Cansei do deslumbramento por causas. Cansei do existencialismo gratuito.
Nao quero sentir mais isto. Chega. Acabou. Assassinei os meus pierrots.

Vou dançar em cima de mim do começo, para me sentir mais e maior.
Vou abraçar me a cores. Sempre consciente que sou fascinante a preto e branco.



Ainda não penduramos o nosso lençol

Nem o lençol de protesto nem o de rendição.
De facto perdoei me no banho, enquanto apertava o corpo com as unhas de verniz lascado. Mesmo assim ainda femininas.
Tentei passar por mim outra vez, e fiz e refiz a tua trança vezes sem conta, para que te pudesses aceitar e amar um bocadinho mais na loucura dos dias.
Desfiz a trança na madrugada, talvez num acto de aceitação. Avançaste, não bem, mas firme, como avanças sempre.
Também gostava de ser melhor, de morrer duma boa maneira, atrevo me a dizer grandiosa.
Nao chores. Podes sempre chamar por mim e eu faço te sentir bonita.
Mas vou na mesma continuar a ser menos do que sonhei para mim.

29.11.08

tributo póstumo à minha dependencia emocional
9
terapia inata para futuras entregas



28.11.08



mary 's


got the same


size


hands as


marilyn monroe


amor explicito


Nao sei se é o calor da tua casa ou das tuas mãos que me fazem querer ficar quando me pedes para ficar. O conforto é demasiado tentador e as palavras sao tao o que quero ouvir..o que preciso de ouvir. Fico e durmo. Em paz, porque respiro melhor com o textura dos teus lençois. Ou será das tuas maos? Ou das tuas palavras.

Rendição. Quero manter me onde sempre estive. Como sempre fui. Distante e à margem. Quero que queiras sem pensares que quero..mas quereres à mesma. Não consigo. Só quero adormecer. Livre de tudo, de mim até. Pontas dos teus dedos nos meus olhos quentes. Brincas distraido com o desenho dos meus lábios a amar devagarinho queixas e mimos. E eu adormeço. So porque quero. Estás aqui.

Não estás, e desafiamo nos de novo.

Perdoamos os confrontos externos e confitos interiores. Cansamos das horas pesadas . E devolvemo nos de novo ao sono entre promessas pornográficas. Ja nao sei onde me deixei, aquela que sempre quis ser, que sempre quis que amassem.

Amas. So porque sou. e ja cortejas os meus ombros como antes das horas dificeis. Alivias a minha ansia. Cobres me de ti e das me amor sujo, tentadoramente tenso e violento.

Agora está tudo tao esmagadoramente calmo, sem os raros surtos de dádiva incondicional. Sem os despojos infantis das horas vazias. Sem as conversas de casa de banho e os segredos de alcova.

A minha alma está tao fria como a tua cama.

Nao adormeço

Branca de Neve e os 7 anões





Ao contrário do conto, já contava que estivessem sete no quarto. São anões, são pequenos. Não os ouve porque falam baixo, nem os vê porque não estão no seu campo de visão mais preguiçoso. E são pequenos outra vez, não chegam às coisas e já nao apetece ajudá-los, pelo menos não mais. Mas o local é bonito, é exterior a ela, alheio à casa. Não percebe se ele é amigável ou hostil. Se é sujo ou só desarrumado. Se barulhento ou apenas está vivo.


Isto é Nápoles.


Golfo amontoado de casa, lixo e cães de rua.


Paisagem cronológica, com camadas de adaptação. Liderada pelo Vesúvio, enfeitada por Capri. È prosaica, mas pouco humilde, pavoneia se na sua grelha de vielas demasiado estreitas, com demasiados estendais e janelas em demasia também. Esquinas de mafiosos. Motas com mulheres mal maquilhadas e brilhantes. Muita gente, muito diferente, muitas histórias. Cliché, mas bem suado nesta cidade. Carros atropelam se e abafam as pandeiretas das famílais ciganas que cantam, tocam e sorriem, todo o dia, à espera. As lojas são do dono, não do cliente, não importa a venda. Fecham se no negócio: presépios, brinquedos ancestrais, instrumentos de música. Cedo é escuro e também cedo nos é desenvendada a riqueza e o perigo. Italianos barrigudos, os dos filmes, com o gorro amarrotado, pousado na cabeça. Sorriem, um sorriso pouco benvindo, mas pouco inimigo também. Os imigrantes dão passadas maiores quando faz noite. E as avós gordas calam os putos e botam nos para dormir. Mas da fachada de elmo, o campo de visão preguiçoso, maior e mais acima, são apenas anões.



filhA do pAi

Não foi de propósito, encontrei-o na escrivaninha. Era pequeno e tinha uma capa em couro, o que era inédito para mim, um caderninho que cheirava a antigo e a aventura; daquelas que eu lia escondida debaixo dos lençóis. E tinha uma moldura de cornucópias douradas. Desculpa..Não resisti a abrir e tinha a tua letra. A tua letra docemente desenhada. Passei horas a fio a imitá-la. Rabisquei dezenas de folhas do meu caderno sem capa de couro para conseguir criar o teu abecedário. Nao consegui. Li o teu diário e era triste. Tinhas 15 anos e eu tinha 13. As páginas eram amareladas, e eu acreditei mesmo que nunca ia ser como tu, nem ia ter tanta coisa dentro de mim como tu tinhas, nem ia chorar tanto como tu choravas. Falavas do teu pai lá, e eu nao percebia, e dizias que tinhas medo...nunca te vi com medo. Falavas de amor, platónico como tudo o que é prazeroso na tua vida. E condenaste esse amor nas páginas do diário, e eu fixei até hoje que ele não existia para ti, e que aceitaste o léxico mundano e formas quotidianas como as tartes de maça e os cariocas. Fiquei tão triste, era criança, queria que aquela estória acabasse bem, e nem me apercebi que fazia tão parte da tua história. Sabes de quem falo, aquele, que tinha a morte nos olhos.. e que morreu. Sempre quis que tivesses ficado com ele, não sei porquê. Lembro me de mais coisas que queria, lembro me duma frase: "o ódio destilado no alambique da guerra". Soava tão bem, era tão barroco e exuberante. Desejei com todas as forças do meu ser escrever assim, e escrever assim com a tua letra..ia ficar tão lindo, pareceria uma iluminura, com aquelas maiúsculas autoritárias. Quis escrever como tu antes de saber sequer o que a frase significava. Um dia decidi, lambi os dedos e avancei as folhas do dicionário, como sempre me ensinaste, para saber o que era "alambique"..desculpa não sabia, e também não conhecia destilar. Senti que devia ter lido mais, tu bem dizias. Eu compreendi a frase, não a entendi. A clareza do entendimento veio mais tarde, e foi avassalador. Qualquer forma de escrita, nunca me vai atingir do mesmo modo que esta frase, porque nunca mais encontrei nada tão poderoso e que me fizesse sofrer tanto. Senti vergonha por entender o tipo de ódio a que te referias. Foi o primeiro objectivo da minha vida, daquelas pequenas ocorrências da infância, as que ficam. Escrever como tu, conseguir extrair mais da língua do que o que ela própria oferece. Este foi o primeiro e mais puro entendimento da minha existência intelectual e emocional. Quis te descobrir mais, mas és tão distante mãe, quis ouvir a Paixão Segundo S.Mateus de Bach, e depois de ouvi-la quis aprender a ouvi-la, houve alturas, aliás, que, para te combater, ouvi incessantemente a Paixão Segundo S. João, só para me provar que não somos iguais. Mas a Paixão Segundo S. Mateus é mais bela, e mais sofrida como tu. Depois percebi a tua missão, percebi que não conseguiste viver mais depois que eu nasci, ou se calhar depois que ele morreu, ou então nunca conseguiste viver. Porque és tão magnânima e exterior a ti? O mundo não tem de depender de ti. Quando morreres as flores não vão desabrochar do mesmo modo. Ninguém disse isto, nem ao Pessoa nem ao Campos. Eu sou o teu ponto de referência, mas quero deixar de ser. Porque achas que eu te afasto mas que preciso de ti? Mãe, es tao sábia com as palavras e o léxico pregou te uma partida. Eu aproximo te, e preciso te. Mas tens de descer a mim. Nao! Tens de me deixar subir a ti. Tornares tudo plano, sem quebras ou vacilos, só para eu entrar um pouco no teu mundo e passares tu a ser o meu ponto de referência e menos a tal ocorrência de infância. És tu para todos. Desgastas-te para seres de todos, e todos têm espaço para serem mais deles. E todos os dias és menos de ti e para ti. Nao deixes mãe. Escreve o teu livro. Tu achas que não tens autoridade. Ganha essa vitória a ti mesma, permite te a entregares-te sem almofadas, tintas ou pérolas. Plantamos uma árvore juntas.

Ensinaste me a escrever, agora eu ensino te a ti.

epitáfio aka ode à vida

por Ines Andrade





"epitáfio aka ode à vida": nao encontro conceitos que se enquadrem melhor neste cenário que pintaste em correria por mim. Por mim porque sei que o sentiste, como sentirias se eu aí estivesse, a pintar os olhos debaixo da luz fraca da tua casa de banho como quando eramos crianças. O'neill verbalizou os meus medos..defendo me da morte, mas se, ou quando ela chegar, so tu terás o dom da palavra para a despedida.
Aprender é descobrir o que já sabias. E descobri em Assisi uma paz que pensei pertencer só a mim (que egoísmo eu sei) mas aprendi que a fé existe e que nao precisa de tapete de entrada. Aprendi que a minha mãe tem razao, sou uma rapariga da cidade, cuja obstinação so me defende das coisas erradas, mas encontrei em Assisi a verdade. Na cidade nao me sinto capaz de escrever um livro. Em Assisi sei que vou escrever um livro.
Nao aprendi a (des)esperar, ja quero escrever um livro sem ter plantado a àrvore e feito o filho..Desculpa, mas quando escrevo estou no meu campo de batalha, daquela que falas que travamos? Bom, domino quando escrevo, e nao estar aí, onde o ar é despretensioso, fez me perder esse controlo. E se eu nao souber escrever mais? Se nao souber desafiar mais a lingua que sempre foi minha? Até ela vai mudar, mariana, até a nossa lingua vai abandonar as minhas mãos e eu nao vou poder contar pelos dedos os pormenores, as acções e as pessoas que me pertencem.
Nao sei plantar uma árvore, preciso mesmo que me ensines, sim? O filho é mesmo a verdadeira criação, surpreende-te, ama te e mata te. Um livro não, o livro é branco, mari, e tu dás lhe ordens, guardas, riscas, rasgas, desistes, retomas. Um filho não admite prefácios e o único "marcador" que algum dia terás serão desenhos de primária.
Mas voltemos à infancia que nao tivemos...



Dorothy, bate três vezes com os calcanhares para eu voltar para casa....



O filho e o livro

(por Mariana d'Orey)
" As pessoas tratam de pôr uma pausa ou um stop nestas conversas. Incomoda-as” dizias tu numa das nossas trocas de palavras. Acesas, irreverentes e profundamente tenras. Não imaturas, mas tenras, frescas, prestes a desbotar. A Inês das mil e uma verdades e a Mariana dos mil e um segredos, o filho das mil e uma alegrias, o livro das mil e promessas.Nessa tarde fria de Novembro em que os nossos olhares se encontraram no suor das nossas conversas. Sim, porque as nossas conversas suam. Soam porque ganham vida e ritmo próprio. Bem, dizia eu que nesse fim de tarde amarelo em Portugal e vermelho em Roma (sempre gostei de ver o amarelo e o vermelho juntos) estavas especialmente amedrontada. Estavas amedrontada porque estás longe e tens medo que isso te afaste da tua mais nobre missão: escrever. Por isso, e só por isso, me lançaste ideias sem sustento (pelo menos por enquanto) de escrever um livros. Sobre quê? Não sei. E tu também não. Só sabes que incessantemente queres desenhar letras e sujar as tuas mãos de papel e carvão. Só mais tarde percebeste porque te disse que na vida temos de plantar uma árvore, ter um filho e escrever um livro, por esta ordem. E aí o sangue subiu-nos ao coração e, de uma forma quase simultânea, desafiamo-nos para mais uma batalha de pensamentos. Batalha não porque somos mulheres de paz, diria melhor um flirt de pensamentos. Intenso, provocador e incomodativa para todos. Menos para nós. Defendi a ideia de que um livro devia vir depois de um filho. Nem sei se é verdade, mas disse – to na mesma. Porque era isso que precisavas de ouvir. Tu, do teu recanto, afirmavas que não, que um filho era a derradeira criação. Nem sabias bem se acreditavas nisso. Mas disseste – o na mesma. Porque isso justificaria as tuas novas ficções para acalmares a alma. Por fim, eternas amantes do entendimento, encontramos um caminho comum. Se era o livro ou o filho a derradeira criação não sabíamos, a que cumpria era ainda a primeira: plantar uma árvore. Colocar a semente, regá-la, cuidá-la e dar estrutura a cada uma das ramificações. Quando voltares quero que plantes a tua árvore ao lado da minha árvore. Ela ainda está pequenina, mas concerteza será capaz de abrigar a tua semente do sopro do vento e dos risos da chuva. Um dia mais tarde não duvido que a tua jovem árvore relembra a minha, nessa altura já carregada das rugas do tempo, o processo de fotossíntese e as malandragens do sol. Se na vida temos de fazer três coisas – plantar uma árvore, ter um filho e escrever um livro – então no nosso percurso temos também de nos cruzar com três pessoas – o Papa, o Paulo Moura e a Inês Andrade.
Ao lado do homem vou crescendo
Defendo-me da morte quando dou
Meu corpo ao seu desejo violento
E lhe devoro o corpo lentamente
Mesa dos sonhos no meu corpo vivem
Todas as formas e começam todas as vidas
Ao lado do homem vou crescendo
E defendo-me da morte povoando de novos sonhos a vida.






O'Neill
manhãs frias

Há algum tempo que nao escrevo um post. os textos cessaram porque findou também a histeria inicial de viver num novo cenário, com novos movimentos, novas pessoas, novas paisagens, encantadoramente tentadoras.Com o passar do tempo apercebi me como algumas pessoas recorrem à fuga para se encontrarem e outras perdem-se quando longe do refúgio.
Em roma, o ritmo frenético dos 6 milhões de pessoas tornam a cidade quente e abafadora, mesmo quando chove, não há espaço para os aromas lusos tão familiares: o perfume queimado das lareiras nos primeiro dias de novembro, e o orvalho telúrico das chuvas, tão típico.Antes de regressar ao meu país, tudo em itália me parecia negativo, cada caminhada, passeio, refeição ou programa merecia um olhar depreciativo da minha parte. amei platonicamente Portugal durante 2 meses.Agora que aqui estou, o amor é genuíno, porque vivo os pormenores da minha terra natal com calma.Tenho saudade de roma, talvez tenha saudade de mim em roma, como também sentia falta da inês que sou em no Porto.Se calhar em roma, descobri qual o melhor de mim no Porto, como agora que aqui estou foi me apresentado o melhor de mim em Itália.Desafiante é conjugar as duas faces desta descoberta. não quero voltar para Itália, mas também não quero sair de lá.A diana tem razão, roma tem segredos, o Porto não tem, porque no Porto as coisa boas são explícitas. em roma guardamos só para nós os detalhes da cidade que nos fazem aguentar a distância, que fecundam a nossa introspecção, o diálogo intrapessoal que não temos no Porto, porque já o damos como garantido, é demasiado nosso.
Os meus segredos são simples.
Os cafés da Amália. irónico, buscar a protecção de uma personagem tão prosaica, como uma empregada de café, que coincidentemente possui um denominador comum com Portugal, o nome.

Os floristas abertos toda a noite, nas avenidas escuras dos arredores romanos, iluminam as esquinas com girassõis, rosas e orquídeas, para presentear amantes nas madrugadas.

A linha do 87, que apelidamos carinhosamente do autocarro turístico, que me acaricia pela manhã com as melhores visões de roma

Os gelados, são quase como a realização dum desejo infantil, sabores que, secretamente, sempre esperamos que existissem, e afinal existem mesmoimprevisibilidade da cidade, quando já pensamos que vimos tudo o que de importante há para ver, presunção nossa, ela mostra nos uma paisagem nova, quase sorrateira, de tao descontextualizada, mas que arranca um sorriso de conforto

Por fim, os testes a nós mesmos, não é uma característica directa de roma, mas que desencadeia acontecimentos só possíveis lá.

desvendem os vossos segredos

lugares comuns

As saudades são um lugar-comum, dizer que a falta do ninho desampara-nos sempre que nos atiça um cheiro ou uma imagem, ou uma simples lembrança casual...A grande verdade é que um lugar-comum é aquilo de que mais puro e genuíno emana de nós, e ao verbalizá-lo (swelllliiiiiing) todos sabemos o que significa. Sinto a maior inocência das inocências possíveis, daquelas birras infantis de precisar tanto de ter algo que se chora até cansar e os olhos ficam a arder. Eu preciso de vocês...

a charneira

19.12.07

Fashion Victims

por Ines Andrade




"Deixem desmoronar, será a culpa de Israel e dos Americanos", palavras de Yasser Arafat no ano da sua morte. Mal o líder da OLP sabia que, em 2007, num pequenino país à beira mar plantado, milhares de estudantes iam andar pelas noitadas do Porto envergando o “belo do lenço”. Esta epidemia está a abranger os jovens da nossa sociedade, nascidos, curiosamente, entre a primeira e segunda Intifada.
O tradicional lenço quadriculado, o kaffiyeh, representa décadas de luta pelo território palestiniano, mas para a geração “morangos com açucar”, o lenço não evoca violência nem nacionalismo, não passa dum artefacto que combina com as all-stars rosa e os cintos Dolce&Gabbana. Depois de ateus a usarem santos ao pescoço, clientes assíduos do macdonald’s com imagens do Che, um anúncio da Nike com a “revolution” dos Beatles, só falta contrastar o lenço com a estrela de David. Cria-se um intenso paradoxo entre um símbolismo ideológico e um comportamento consumista próprio do sistema capitalista.
Em voga está o “bandit look”. “Bandit look”? Vende-se um estilo rebelde e revolucionário para preencher o vazio duma sociedade que demitiu os heróis; uma sociedade em declínio, sem aspirações ou soluções, que se apropria dos ideais alheios desapropriando-os dos seus propósitos? Geração enganada voluntariamente, presa num argumento de vídeo-clip sem conteúdo, onde a próxima conquista passa por conseguir uma “espécie de lenço TALIBAN” (preto, vermelho, azul ou verde), a combinar com o cardigan cinzento. Um lenço “versátil” para todas as ocasiões, com o “padrão” adequado para as bebedeiras (atipicamente muçulmanas) e o estilo “étnico” exigido nesta colecção. Os miúdos estão-se realmente a “borrifar” para lutas ideológicas desde que consigam “guest” para a discoteca; e vê-los em manifestações só se houver cerveja à borla. Nesta geração “copy/paste” o que todos usam tem de se adquirir, e assim lá andam eles, com o lenço ao pescoço, o lenço cuja função na Palestina é proteger a cabeça do sol, e os olhos do pó. Pó e areia que a população juvenil ocidental lhes atira.
“Yasser Arafat sabia que os ícones se fazem de outros ícones, de imagens permanentes que entram no imaginário como símbolos inapagáveis”, o que ele não sabia é que, da mesma maneira que o Che Guevara acabou estampado em t-shirts de 1.50€, o kaffiyeh seria o último grito das “fashion victims”; vítimas sim, duma sociedade egoísta e nada preocupada com os telhados de vidro dos vizinhos, ou com as “pedras” que uns e outros atiram.






30.11.07



Frederico Ferreira: à flor da pele

por Inês Andrade


Frederico Ferreira é escultor e, este ano, concebeu as máscaras para a tour “Sound in Light” dos Blasted Mechanism.

Licenciado em Artes Plásticas pela Faculdade de Belas Artes do Porto, Frederico considera que “ as minhas peças são vitais para mim e presumo que um reflexo natural da minha pessoa”.

A oportunidade de colaborar no projecto dos
Blasted Mechanism surgiu de “um acaso do destino” visto que o mentor do grupo, Valdjiu, lhe telefonou por engano para o telemóvel e partir daí criaram uma “relação muito frutuosa”. “No momento desse contacto os Blasted já possuíam ilustrações da sua nova imagem realizados pelo ilustrador Ricardo Venâncio. A partir dessas imagens realizei a concepção plástica dos fatos tendo tentado dar plasticidade e vida a uma estética que curiosamente tem muito a ver com o meu imaginário, tendo resultado assim num trabalho extremamente gratificante a vários níveis.”

" A ligação às artes surgiu duma maneira muito natural". Optou pela área artística no último ano do secundário, até aí, o percurso académico esteve associado à engenharia, nomeadamente mecânica. O cariz tecnicista do agrupamento proporcionou-lhe conhecimentos fundamentais que transparecem no seu trabalho actual.
A aprendizagem real e a afirmação como artista no meio começaram fora da faculdade:" aprendi “TUDO”, aprendi a importância de vivermos abertos para recebermos o mundo e ficarmos agradecidos por isso".
Receptivo à mudança e à inovação Frederico desde cedo participou em exposições colectivas nos

O lançamento da sua obra levou ao reconhecimento do seu potencial. Em 2005 ganhou o 1º prémio no Concurso Nacional de Escultura Art’s Business & Hotel Center, em Lisboa, com a escultura Silent Blow, uma metáfora do seu voo como artista: "Silent Blow ou sopro silencioso remete-me para a possibilidade de elevação através de uma brisa silenciosa que nos faz pairar acima de algo terreno". A escultura é" uma evolução natural de uma sela de montar da qual se desenvolve um par de asas que a qualquer momento nos permitirá essa elevação".

Esta consagração definiu os traços actuais da sua obra, orgânica, sensual, descomprometida; "onde a ideia e as imagens mentais regem totalmente o seu trabalho". "Tudo é realizado em função de um imaginário que aos poucos" vai "conhecendo melhor", assim, "os materiais vão-se seleccionando e organizando criando uma forma funcional que se aproxima da imagem mental original".

Mas esse imaginário não se entrega só a peças a fluidas e suaves. A colecção Interfaces, exposta em 2005 na
Este registo, esta "motivação de reflectir sobre a capacidade de potenciação que os
instrumentos tecnológicos nos permite está", também, presente no seu trabalho. Na peça
“The Possibility of Death at Your Own Fingertips”, um volante dum automóvel onde se fundem dois revólveres, Frederico aposta numa reflexão sobre a tecnologia como prótese do ser humano.

Actualmente
Frederico, 30 anos, vive e trabalha no Porto, alternando em visitas a Lisboa. Lecciona Desenho e Figura Humana no curso de Design de Moda e é professor de Design Básico no Citex.
Colabora na galeria Exteril, uma criação de Teixeira Barbosa à qual pertencem 18 artistas.
No próximo dia 15 a
Exteril vai organizar o evento 15’m de fama, no qual Frederico terá 15 minutos para montar, apresentar e desmontar um projecto.

uma mulher é ser de pouca fala, como se quer, parideira e calda, explicava o meu pai, ajeitada nos atributo, procriadora, cuidadosa com as crianças e calada para não estragar os filhos com o seus erros (...)
la hembra
condenadas à inferioridade, á fraqueza. um corpo que as obrigava, sem falta, a uma maleita reiterada, como um inimigo habitando dentro delas, era o pior que se podia esperar, um empecilho de toda a perfeição, e tão belas se deixavam quanto doloridas e acossadas, por isso eram instáveis, temperamentais, aflitas de coisas secretas e imaginárias, a prepararem vidas só delas sem sentido à lógica, tinham artefactos e maneiras de parecer gente sem querem perder tudo o que deviam perder, eram, como sabíamos bem, perigosas.

in remorso de baltazar serapião
(valter hugo mãe)

29.11.07

caça às bruxas

dia 1 de janeiro de 2008 entra em vigor a proibição de fumar em locais fechados.
o que me espanta não é a extravagância do acto em si. duas coisas me parecem muito piores. em primeiro, a facilidade com que em todo o ocidente o estado resolveu intervir na vida privada de cada um negar radicalmene o direito de propriedade (ipedindo, por exemplo, que se criem restaurantes de fumadores), sem um protesto sério em parte alguma, em segundo lugar, a rapidez co que o fumador foi socialmente estigmatizado e o vício de fumar ( há 20 anos, normal e aceitável) se tornou quase o que era antigamente uma blasfémia, uma profanação ou uma heresia. isto não anuncia nada de bom. ´(...) já se viu que o poder do estado para converter a populaça ao objectivo tenebroso de melhorar o homem é hoje ilimitado. a metamorfose das democacias do ocidente em totalitarismos de uma nova espécie não incomoda ninguém para hitler (que nao fumava nem bebia) o alemão perfeito não andava longe do perfeito espécime do ocidente contemporãneo. imagino muitas vezes quem, de facto, quererá este mundo sufocante, asséptico, obcecado com a "saúde"? gente, como é óbvio, com pouca imaginação.

Vasco Pulido Valente Público 9.11.07

a busca ao paradigma exemplar do homem perfeito nao pára.
a oferta constante duma vida regrada, disciplinada que trará longevidade é perigosa
além do tabaco, do alcool, das drogas, da obesidade há também

orgulho hetero da tagus
ou diremos antes
orgulho de ser homofóbico

o que se passa?
será que este tipo de comportamento passou a ser de tal modo aceitável que uma empresa consiga conceber a ideia de que a imagem projectada da marca vai melhorar?
é necessátio redefinir valores, perderam-se, e perdeu-se a garra de lutar por tais valores.
todos escrevem, todos são "livres de se mnaifestar contra ou a favor" deste tipo de campanhas, mas na aldeia global em que vivemos essa liberdade dipersa-se no maior meio de comunicação: a internet.

o contacto e a comunicação estão num limite nunca antes visto e a informação é ilimitada. as pessoas isolam-se e a individualidade torna todos estes acontecimentos obsoletos e reversíveis

5.6.07

HABLE CON ELLA

filmar la muerte es, a veces, la más bella forma de hablar de la vida

27.4.07

PoeSia orGasmO

de silabas de letras de fonemas
se faz a escrita. não se faz um verso.
tem de correr no corpo dos poemas
o sangue das artérias do universo.


cada palavra há-de ser um grito.
um murmurio um gemido uma erecção
que transporte do humano ao infinito
a dor o fogo a flor a vibração.


a poesia é de mel ou de cicuta
?
quando um poeta se interroga e escuta
ouve ternura luta espanto ou espasmo?


ouve como quiser seja o que for
fazer poemas é escrever amor
a poesia o que tem de ser é orgasmo.


Ary dos Santos
fOtogRafiA

just

livro de horas


aqui diante de mim, eu, pecador, me confesso de ser assim como sou. me confesso o bom e o mau que vão ao leme da nau nesta deriva em que vou. me confesso possesso das virtudes teologais, que são três, e dos pecados mortais, que são sete, quando a terra não repete que são mais. me confesso o dono das minhas horas, o dos facadas cegas e raivosas, e o das ternuras lúcidas e mansas. e de ser de qualquer modo andanças do mesmo todo. me confesso de ser charco e luar de charco, à mistura. de ser a corda do arco que atira setas acima e abaixo da minha altura. me confesso de ser tudo que possa nascer em mim. de ter raízes no chão desta minha condição. me confesso de abel e de caim. me confesso de ser homem. de ser um anjo caído do tal céu que deus governa; de ser um monstro saído do buraco mais fundo da caverna. me confesso de ser eu. eu, tal e qual como vim para dizer que sou eu aqui, diante de mim!
Miguel Torga



editar vida

"escrevi este livro na felicidade louca de escrevê lo"